Há algum tempo, mencionei a relação entre o ouvir e o pensar em línguas Macro-Jê, e seus possíveis correlatos culturais:
[...] em línguas do tronco Macro-Jê o ouvido (e não a cabeça, como em português) parece ser o "locus metafórico" para conhecimento/consciência. Assim, nas famílias Jê e Jabuti, a raiz para "ouvir" (que tem cognatos em ambas as famílias e é, portanto, provavelmente reconstruível para o Proto-Macro-Jê) também tem os significados de "experimentar", "entender", "saber" (Ribeiro & van der Voort 2005). E, em Karajá, "pensar" e "ouvir" são ambos expressos pelo mesmo verbo (derivado do nome "ouvido"). Ser burro é "não ter orelhas/ouvido"; perder a consciência é "entupir o ouvido/orelha"; esquecer-se é "perecer o ouvido"; lembrar-se é "acordar o ouvido"; e assim por diante (traduções aproximadas). [...]Relendo, agora, o Esbôço gramatical e vocabulário da língua dos índios Borôro (Rondon & Faria 1948), encontro dados que demonstram a existência de fatos semelhantes também nesta família Macro-Jê: biá 'orelha, ouvido'; bia-butuN 'lembrar'; bia-gôdo 'esquecer'; etc.
Ainda continuo interessado em quaisquer possíveis respostas a minhas duas questões iniciais:
(1) até que ponto estes "esquemas metafóricos" são estáveis diacronicamente (servindo, assim, de evidência para relacionamento genético)?(2) até que ponto podem ser emprestados (servindo, assim, como evidência de contato lingüístico, áreas lingüísticas, etc.)?