Sunday, April 19, 2009

Talibão e talibinhos

O processo morfológico que se chama em inglês blending ("mistura"?), em que uma nova palavra é formada com partes de duas ou mais palavras, não é muito usado em português -- apesar de, na mão de um talento como Guimarães Rosa, produzir belezas como ensimesmudo e fraternura. Em nossa língua, tais palavras, apesar de belas e transparentes, acabam limitando-se à linguagem literária, não ganhando circulação na linguagem quotiana.

Em inglês, por outro lado, palavras formadas por blending abundam, fazendo parte do léxico do dia-a-dia: spork (spoon + fork), brunch (breakfast + lunch), ginormous (gigantic + enormous) estão entre as que se ouvem o tempo todo [não sei se fantabulous (fantastic + fabulous) pega bem...]. Provas da produtividade do processo são criações recentes como staycation (stay + vacation, para designar férias em que o indivíduo não viaja, conseqüência da economia em crise) -- recentes, isto é, pelo menos para mim, que sou fresh-off-the-boat. Dada a receptividade da língua inglesa a tais construções, é natural que se faça amplo uso do processo de blending na publicidade. Por exemplo, por ocasião da última eleição presidencial nos EUA, viam-se adesivos de pára-choque com o seguinte apelo ao eleitor latino: ¡Obámanos! (Obama + ¡vámonos!).

Uma das minhas favoritas, no entanto, é talibangelism (talvez inspirada por uma outra palavra formada por blending, televangelism), que diz respeito (como se pode imaginar) à pregação evangélica conservadora, com um fundamentalismo semelhante ao do Talibã afegão. A palavra, útil para descrever os métodos que caracterizam a atuação de pentecostalistas pelo mundo afora, seria certamente útil no Brasil, em que cristãos fundamentalistas, donos de redes de TV e rádio, bombardeiam o público com sua versão oportunista de cristianismo. Como, depois de uma busca no Google, não encontro na internet sua possível versão para o português ou o espanhol, aqui vai minha sugestão: talibangelismo. (Não que eu ache que o que é bom pros EUA seja necessariamente bom pro Brasil; mas, neste caso, como ambos (pentecostalismo fundamentalista e talibangelism) são criações norte-americanas, acabam se merecendo, não?)

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