Quando criança, a perda de um dente de leite era coisa séria -- tão séria que requeria um pequeno ritual, sem o qual a lacuna do dente perdido supostamente não se preencheria. O dente deveria ser atirado no telhado da casa, depois de se recitar o versinho abaixo três vezes:
Mourão, mourão,(Tam' é, no meu dialeto caipira, alteração de toma, a forma imperativa de tomar.) Não sei se isto fazia parte das regras "oficiais" do ritual, mas, para mim, o telhado sempre devia ser o de casa. Uma vez, perdi o dente na escola e, pedindo licença à professora para usar o banheiro, guardei-o enroladinho em um pedaço de papel, para depois realizar o ritual em casa. Fiz o mesmo quando perdi um dente na casa de uma tia.
Tam' esse dente podre
e me dá um são.
O ritual é, pelo visto, antigo, trazido d'além-mar. É o que fiquei sabendo através do excelente blog O rabo do gato, da madeirense Lília Mata, onde se aprende muito sobre o folclore da Madeira e se descobre que o oceano muito mais nos une que separa. Mas o mistério, para mim, continua: quem era o tal Mourão? De onde teria vindo? E teria, no mundo moderno, perdido o emprego para a tooth fairy?
A propósito, o versinho madeirense, reproduzido d'O rabo do gato, é ligeiramente diferente do meu:
Dente mouro, dente mourão,
Toma lá este podre
e dá-me outro são.
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